quarta-feira, 24 de setembro de 2014

"Projetos não podem ser concebidos para os editais, eles têm que ser concebidos para acontecerem dentro de uma estética escolhida pelo seu realizador", conversa com Anderson Foca.

Foca Dosol
Anderson Foca é quinhentos em um, muitas vezes eu me pergunto, como esse cara consegue não parar 1 minuto? Todo dia é uma novidade, é festival, é incubadora, é circulação, é Camarones, é livro, disco, ... Quando não é tudo isso, é futebol. [Rsrsrs...] 
Agora todo mundo sabe que ele não anda só, na verdade está sempre muito bem acompanhado, e como diz aquele velho clichê "por trás de um grande homem, existe sempre uma grande mulher", nesse caso uma baixista charmosa com a cabeleira que eu queria pra mim, Ana Morena. [Momento inveja boa, rsrs...]
Uma dupla imbatível que trabalha dia e noite com foco e determinação, por isso alcançam êxito e hoje são referências na cena cultural do estado do RN e no Brasil. 

Na semana que o Festival do DoSol foi lançado, não poderíamos deixar de conversar com Anderson Foca e trazer pra cá um post com conteúdo super importante para todos os produtores, artistas e gestores. Aproveitem todas as dicas, aprender nunca é demais. 

1- Quem é Anderson Foca?

Foca: Sou um vivente da música. Dentro dessa vivência faço quase tudo que envolve música, componho, produzo, faço eventos, gravo discos, faço vídeos e  o que mais precisar!

2- O espaço cultural DoSol é hoje uma referência para os produtores e músicos independentes de todo o país. Como foi iniciado esse projeto? Em que consiste o DoSol, produtora musical, espaço cultural, incubadora, gravadora, selo? Como são articuladas essas áreas?

Foca: É tudo isso que você falou aí e mais um pouco. O CCDosol nasceu em 2004, está completando 10 anos de atividade. Ele apareceu num momento em que a gente precisava escoar nossa produção para as pessoas da cidade, uma casa de música autoral que as pessoas pudessem se identificar, ser uma espécie de catalizadora de todo o movimento autoral ligado ao rock que produzíamos naquele período. O dosol em si é uma espécie de atmosfera própria para música sobreviver, criamos ao longo destes 14 anos uma engrenagem capaz de registrar e circular música de ponta a ponta. Isso inclui estúdio, centro cultural, produtora, ilha de vídeo e um monte de empreendimentos culturais espalhadas pelo ano, atividades que fortalecem isso: Festival dosol, circuito Cultural ribeira, Virada Cultural Natal e Natal Instrumental entre outros.

3- Vocês (Foca e Ana) têm uma vida produtiva muito ativa, estão sempre lançando uma novidade nas mídias sociais, seja um show, uma turnê, um evento ou projeto novo. Como funciona essa rotina de trabalho? Como dá conta de tanta coisa e conseguir êxito?

Foca: Primeira coisa é organização desse fluxo, temos muito cuidado com a narrativa do que estamos desenvolvendo. Também fazemos isso há muito tempo e o timing de realizações já é bem menos complexo que nos anos iniciais. Isso fez com que fôssemos capazes de acumular mais atividades sem abrir mão da qualidade do que fazemos e da qualidade das nossas próprias vidas. É uma vivência, um lifestyle. Não tem dia nem hora.

4- Vocês propõem muitos projetos em leis e editais, são contemplados com grandes patrocínios e agregam também muitas parcerias importantes. Como funciona esse processo de captação de recursos em termos práticos? Essa é uma questão que gera muita curiosidade por parte da turma que está iniciando na área e quer saber como funciona o processo de escrever o projeto, lançar na lei, depois ir atrás do patrocinador, preparar ou não um projeto comercial, enfim, como vocês executa essa parte do trabalho?

Foca: A primeira coisa a dizer é que as pessoas só veem os projetos que ganhamos, mas a verdade é que perdemos centenas deles. Acho que 100 para 1. 100 projetos inscritos para ganhar um. Uma coisa que a gente acredita é que projetos não podem ser concebidos para os editais, eles têm que ser concebidos para acontecerem dentro de uma estética escolhida pelo seu realizador. Quando você tem convicção de que o projeto é bom, testa ele com verba própria antes de realiza-lo com os editais, manda um sinal positivo pro mercado e isso faz a diferença na hora de concorrer.  Editais também são um exercício, muitas vezes inscrevemos projetos que sabemos que não temos chance de ganhar só para estudar, mudar, ajustar e se preparar. O Festival Dosol teve sua primeira edição sem patrocínio de leis, a Incubadora também foi feita com verba própria antes de ser aportada por um patrocinador, só para dar dois exemplos de como isso funciona. O Circuito Cultural Ribeira foi concebido e passou três anos na gaveta até ver a luz do dia aprovado num edital. Ou seja, não adianta “criar” projetos em cima da hora para concorrer em editais que a chance de ganha-los é pequena.

5- Sobre as leis de incentivo locais, Lei Municipal Djalma Maranhão e Lei Estadual Câmara Cascudo, o que você acha que poderia melhorar para que esses programas alcancem cada vez mais novas iniciativas e expanda o pequeno núcleo de contemplados anualmente? Será esse um problema da lei ou dos que submetem projetos nela?

Foca: Primeira coisa que a lei Câmara Cascudo poderia fazer é escalonar diferenciadamente cada empresa que se interesse em patrocinar projetos. Com 2% de ICMS de renúncia praticamente só as telefonias, Cosern e outros poucos patrocinadores podem patrocinar de maneira sólida. Isso é um problemão. Acho que as comissões deveriam ser remuneradas e que pudessem fazer visitas na gestão e realização dos projetos. Isso facilitaria as coisas na hora de aprovar ou desaprovar alguma atividade. A Lei Djalma Maranhão é muito mal divulgada, acho que a prefeitura poderia investir em divulga-la melhor. Ainda há muito desconhecimentos dos empresários quanto as leis.

6- Agora falando sobre música, rock! O RN tem uma história muito potente em movimentos autorais, sobretudo no cenário rock, bandas como Impacto Cinco, Alcateia Maldita, Gato Lúdico, Cabeças Errantes, Fluidos, Modus Vivendi, Sodoma, General Lee/Junckie, Florbela Espanca entre muitas outras marcaram os anos 70, 80 e 90.  Você acha importante que essa história seja preservada?

Foca: Acho e fazemos nossa parte. O único registro em disco do General Junkie é lançamento do Dosol só para dar um exemplo. Também fizemos nosso livro de 10 anos que também serve de registro de parte importante dessa história rica do rock potiguar. Não sou contemporâneo desses grupos, mas conheço bem a história, tomara que mais gente se envolva nesse processo, estamos prontos para ajudar no que for preciso.

7- Nas décadas citadas na pergunta anterior o trabalho autoral da maioria dessas bandas era cantado em português. Hoje vemos que a maioria das bandas que toca no DoSol cantam rock em inglês, como você analisa esse contexto?

Foca: Acho que não são tantos grupos assim cantando em inglês, por um momento foi até mais. Eu vejo isso como uma coisa desse tempo atual. Cosmopolita, internético e afins. Muito mais gente falando outras línguas, visitando outros países e tratando a cultura como cidadã do mundo. Não acho que seja um problema. É o gap geracional de hoje e temos que aceita-lo. Eu ainda prefiro bandas que cantam em português, mas não tenho nenhum problema em curtir quem quer outro caminho, seja ele qual for.

8- O Festival DoSol está aí, batendo na porta, e logo mais a cidade receberá um dos acontecimentos musicais mais esperados do ano. Para esta edição como as coisas vem caminhado, quais atrações você já pode soltar pra gente, que novidades o festival está trazendo em termos musicais e também enquanto produto cultural, tipo, alguma campanha socioambiental, digital, educativa ou até mesmo de incentivo artístico?

Foca: Quando essa entrevista tiver no ar já teremos divulgado o line up que está muito legal. Bandas gringas, Céu, Jorge Cabeleira, Pitty, Boogarins, Priguissa, Camila Masiso, quase 100 shows ao todo. Acho que o festival acontecer já é um incentivo artístico tremendo porque ele trabalha diretamente com a divulgação desses artistas que se apresentam e não é de hoje. Vídeos oficiais de quem toca, takes, sessões em vídeo, sem contar na enorme produção que se dá de artistas que gravam já no intuito de participar da mostra. Estamos num flow interessante com os artistas locais, sempre foi assim.

9- O Festival é patrocinado 100% por empresas que renunciam seus impostos direcionando ao projeto aprovado na lei, nesse caso na Câmara Cascudo. A renúncia é de 80%, porém a empresa entra com contrapartida de 20%. Se o valor do projeto está todo pago, porque vocês cobram entrada para o público? Se não está 100% bancado, a entrada é cobrada para cobrir esse restante em aberto ou é cobrada para criar mesmo o hábito do público pagar pelo que está sendo oferecido?

Foca: Temos três patrocinadores master, mas só um se utiliza das leis de incentivo que é a TIM através da Lei Câmara Cascudo, Ray-Ban e Petrobras são patrocinadores diretos, não usam isenção de impostos para nos patrocinar. O Festival Dosol é quase todo gratuito. Todas as etapas do interior são com entrada gratuita e a etapa de Natal vai custar R$5,00 que também é uma maneira de valorização do que é oferecido e também um instrumento que nos dá segurança e controle do fluxo de pessoas dentro do festival. Precisamos de bilheteria e bar para cobrir custos do festival também. Nem sempre o que é pedido no projeto que vai para lei é o que acontece na prática. A lei por exemplo não prevê três cidades que estamos visitando na mostra 2014, só para dar como exemplo.

10- Agora uma pergunta que faço para todos que tenho conversado aqui no blog. Quais são suas referências culturais, o que você costuma ouvir, ler assistir, consumir? Quais locais e programas costuma frequentar aqui na cidade, além do espaço cultural DoSol, claro? [risos...]

Foca: Eu sou um frequentador de lugares com boa comida, gosto muito. Eles são via de regra também bons espaços culturais e para ótimos encontros. Vou em muitos shows, principalmente fora do RN (tenho uma banda que circula muito) e adoro estar em festivais de música de todos os tamanhos. São divertidos e surpreendentes.

11- Essa aqui é um bônus track. Como é que funciona essa mistura de trabalho e vida pessoal 24h entre você e Ana Morena?

Foca: Para gente é natural e dá muito certo. Respeitamos bem o espaço de cada um dentro e fora do trabalho e tem funcionado. Não recomendo, mas para gente dá certo, ehehehehe.


Valeuzão Foca pela disponibilidade e gentileza em contribuir com o conteúdo desse blog.

Curtiram? Compartilha! Para saber mais sobre o trabalho de Anderson Foca confiram os links abaixo:

Camarones Orquestra Guitarrística: https://www.youtube.com/watch?v=qOLdpPQIK6E


Produção Mode On! 


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